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Red Tales

(...) cá estou eu, por aqui, a fingir que sou eu que por aqui estou (...)

Red Tales

>> Cuidemos de Todos Cuidando de Nós <<

 

Alguns dos textos aqui contidos são de cariz sexual e só devem ser lidos por maiores de 18 anos e por quem tiver uma mente aberta. Se sentir algum tipo de desconforto com isso ou se não tiver os 18 anos ou mais, por favor SAIA agora.

c a r t a s d e u m q u a l q u e r s o l d a d o

Agosto 29, 2009

 


I


 


Princesa,


 


permitiram-nos hoje parar pela primeira vez. Aproveito por isso, estes primeiros minutos nocturnos, para te escrever. Não sei quando poderei mandar-te esta carta, não sei sequer se terei tempo de terminá-la ainda hoje, provavelmente não. As pausas são curtas. Apesar de todo o treino, de toda a teoria, há uma coisa totalmente diferente por aqui: o tempo. A falta dele. Ou o excesso, ainda não consegui perceber. Tudo se faz muito devagar, mas tudo acontece muito depressa. A sequência de horas, minutos e segundos, por aqui, não tem qualquer significado. O tempo é medido em metros. Não importa o tempo que se demora, importa é avançar. Avançar sempre. Avançar devagar, o mais depressa possível. Mas, permitiram-nos hoje algum tempo, quero aproveitá-lo para te dizer que te amo mais a cada passo que dou nestas areias desconhecidas. Quero aproveitá-lo para te perguntar se está tudo bem por aí e como tens passado o teu tempo. Por aqui, as noites são muito lentas. O silêncio, que tanto amamos, veste-as de medos vermelhos, mutila-nos o sono e prolonga as trevas para além da linha imaginária que separa a razão e o espírito. A mudez, quase completa, é a companhia nocturna que enlouquece e a voz do inimigo que combatemos. Periodicamente, um ou outro rasgo luminoso atravessa o céu e ilumina as dunas distantes. Aqui nem as areias dormem. Passamos a noite acordados, a contar e a seguir os relâmpagos mecânicos que atravessam o céu, a tentar desviá-los com os olhos dos buracos famintos que fingem proteger-nos. Aqui, não raras vezes, prolongamos a noite com medos, na esperança que se prolongue também a vida. Sinto a tua falta


 


II


 


Meu amor,


 


Estou aqui de novo. Passaram já alguns dias desde que comecei a escrever-te. Estamos já perto de uma cidade, mas tudo continua escuro. Escondi-me um instante. Escrevo-te iluminado apenas pela morte anunciada nos relâmpagos que as bombas e morteiros disparados desenham no céu. Escrevo-te a espaços. Cada frase é um objectivo destruído, são corpos que caiem algures. Agora tudo é mais rápido. A virgindade das areias vai ficando para trás e tudo é muito mais rápido. Em breve entraremos na primeira aldeia, depois na primeira cidade. Escondi-me para te confessar que já não sei porque vim. Hoje vi um homem morrer. Estava todo vestido de branco. Trazia numa mão um rapaz, não tinha mais de onze, doze anos. Na outra trazia uma espingarda, acho que artesanal. Uma velha espingarda, demasiado velha para ser usada e demasiado espingarda para estar na mão de um tão velho homem. Disparou contra nós. Apesar dos avisos, apesar dos gritos, disparou contra nós. Tiveram que o matar. Duas balas trespassaram-lhe o peito. Ao rapaz não sei o que lhe fizeram, mas está vivo. Já não sei porque vim, meu amor. Tenho saudades do teu cheiro.


 


III


 


Meu amor,


 


Estamos ainda às portas da primeira cidade. Quem sabe se da última cidade no meu caminho. Terminei a última carta, que ainda não pude enviar, dizendo-te que já não sabia porque vim, que já não sabia porque deixei contigo o amor que me ensinaste e vim para esta terra onde a morte é a única que sabe amar alguém. Mas tu deves lembrar-te, amor. Deves lembrar-te do pouco que pude contar-te nos meses que antecederam esta viagem.

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