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Dezembro 20, 2018
uns dias depois de todo o azul que vivemos na tenda, combinámos eu ir-te buscar a casa depois de jantar. nesse dia, o princípio da noite fez-se de calor, mas com a escuridão veio a habitual cacimba gelada. ainda hoje não sei se é a proximidade ao mar ou ao pinhal – assisti, várias vezes, ao nevoeiro a nascer no pinhal, vir de lá sorrateiro e rasteiro, com a mesma densidade do fumo de um incêndio e, em pouco tempo, cobrir por completo toda a povoação.
eu, como costume, tinha ido jantar umas cervejas. com o excesso de álcool, confesso, só a negrura me lembrou da nossa combinação. olhei para o relógio e era a hora exata de já estar a bater na tua porta. saí de imediato. os poços de areia movediça, encontrados logo na saída, atrasaram-me ainda mais. não foi nada fácil arquitetar um plano para os transpor e mais difícil ainda foi encontrar material para o executar. mesas e cadeiras foram a solução.
para ir a tua casa, tinha de atravessar o centro da aldeia. o acesso a ele estava guardado por um morcego gigantesco, de pelo branco e olhos vermelhos. demorei algum tempo para o iludir e, depois de algumas tentativas frustradas, só recorrendo à magia da espada fui capaz de o ultrapassar.
no centro foram múltiplos os felinos, répteis e aracnídeos gigantes com que me deparei. a todos tive que enfrentar e derrotar para chegar até ti.
assim que entrei na tua rua, reparei que tinha crescido e que estava imensa. eu sabia ir demorar uma eternidade para chegar a tua casa. isso não me demoveu de, enquanto a percorria, saltar o muro de alguns jardins e compor um imaginativo ramo de flores e outros verdes. claro, àquela hora todas as flores estavam fechadas, mas não fazia mal, eu sabia que gostavas.
quando bati à tua porta passavam três horas do combinado. abriste. viste que era eu e fechaste. nem uma palavra trocámos. a ação, o álcool e o sufoco subiram-me à cabeça e desceram-me ao estômago muito rapidamente. atravessei a estrada, acocorei-me e vomitei.
tinha a sensação de já estar a vomitar as entranhas quando te ouvi atrás de mim: