#71
Outubro 25, 2025
Solidão de Chumbo
A solidão não tem música nem tem pressa. Tem o peso, sim, de um bloco de chumbo que se instalou no centro do meu peito, roubando espaço aos pulmões e aos batimentos. Não é ruidosa, nunca. Apenas... comprime. Ninguém a vê, a não ser eu, enquanto me observo encolher — os ombros curvados como se tentassem anular a minha própria altura, o pescoço a retrair-se para dentro da camisola. Ela é um mestre silencioso na arte de nos tornar pequenos, de nos encurtar contra a vontade.
É uma gravidade pessoal, que só atua em mim. Cada passo é lento, cada movimento é uma luta contra este lastro invisível que me obriga a andar curvado, a proteger o corpo do frio que irradia do seu toque. Ela não precisa de gritar ameaças; a sua presença é a promessa de que nada se moverá ou mudará. E é esse silêncio, essa inércia fria, que pesa mais que o chumbo, mais que o meu corpo inteiro, até que a solidão me tenha moldado à sua imagem: uma figura quieta, de contornos esbatidos, habitando um espaço onde o eco da minha voz não tem tempo de regressar.