carta
Dezembro 09, 2020
Fico triste. Fico triste por saber que as minhas palavras não atingem o lugar onde guardas a minha culpa. Não são capazes de a embrandecer. Não recuperam, nem sequer tocam, lágrimas endurecidas. O lugar onde repousam e festejam não se cruza com o perdão e, mais que me entristecer, isso quase me revolta e, admito, baralha-me, pois, apesar de esse ser um bom motivo para deixar de te amar, não consigo fazê-lo.
Disseste-me que destruí – e eu acredito nisso. Eu não sabia. Havia tanto desconhecido. Tanto tempo ainda por nascer. Só o branco da tua pele, como pérolas. Os dias passavam e a tua voz era cada vez mais. Tive medo – o Sol. Nunca to disse: havia lágrimas. Há uma promessa. Eu desconhecia e tu disseste-me e eu tive medo. Os dias eram sorriso e as noites eram demasiado perfeitas. Eu não sabia e agora resta-me a crueldade de um tempo sempre lento. Queria ter sabido. Como sabia o caminho. Como sabia das árvores, dos rios e das dunas. E do sabor.
Tenho a sensação de que, depois de ti, a minha vida se tornou uma sequência de acontecimentos aleatórios e sempre inacabados. Depois do teu, nenhum corpo me parecia um corpo. A tua boca. Os teus pés. A forma lenta dos teus braços. A quase transparência e o para sempre.
Fico tão triste que as minhas palavras ou o infinito não abrandem a culpa.