Escrever
Abril 07, 2016
Muitos me perguntam como é que um tetraplégico escreve. Eu explico. Não sou tetraplégico sou tetraparésico. Escreve-se com o cérebro e com os dedos – que não paralisaram na minha tetraparésia.
Eu uso o rato e o teclado virtual do Windows. E sei de casos de tetraplégicos que escrevem tocando nas teclas com um lápis preso entre os dentes. Há casos muito piores que o meu. Haja paixão. Haja amor ao que se faz.
Eu uso o rato e o teclado virtual do Windows. E sei de casos de tetraplégicos que escrevem tocando nas teclas com um lápis preso entre os dentes. Há casos muito piores que o meu. Haja paixão. Haja amor ao que se faz.
Quanto ao processo de escrita, na prosa, começo por imaginar a história em traços gerais e depois vou construindo ao redor disso sem nunca perder o meu objetivo de vista. Um bom truque é dar um nome ao texto logo que se arranca. Isso mantém-nos focados. Já na poesia o processo é ligeiramente diferente. Como um poema é, normalmente, escrito muito rapidamente, é quase impossível perdermos o foco. Esse é um dos motivos para não dar nome aos poemas: não é preciso.
Se calhar tenho tido sorte, mas tirando um – que já explico – a minha condição não me tem trazido problemas na edição, já na divulgação a história é diferente. Um autor pouco conhecido – como eu –, no meu entender, tem duas hipóteses para divulgar o que faz: ou é extremamente talentoso – que não acho que seja o meu caso – ou baseia a divulgação em entrevistas e apresentações – atividades muito limitadas para um tetraplégico que quase não fala. Por exemplo: ninguém entrevista um mudo na rádio.
A dificuldade que tenho na edição é financeira. Como sou tetraplégico não trabalho e a ridícula reforma que recebo é a minha única fonte de rendimento já que os livros são uma casmurrice e contam mais como despesa que como rendimento. Editar, a mim, custa dinheiro. Se calhar existem apoios para casos como o meu, mas estão, de certeza, pouco divulgados – que é o mesmo que não existirem. Sem falsas modéstias, acho que casos como o meu deveriam ser apoiados, mas enfim: haja amor ao que se faz.
O amor ao que se faz deve mesmo ser a terceira regra de qualquer escritor. A primeira é ler e a segunda é escrever. A inspiração existe, mas quando ela chega convém estar a transpirar. É do que ela se alimenta: dar-lhe de comer é boa ideia. Excelente ideia, aliás.