Solidão
Janeiro 13, 2021
estou cansado. já não consigo ser. tenho peixes transparentes a nadarem-me na cara e um pequeno pardal aprisionado ao peito, já sem asas. foram cortadas pela ausência. já não danço. há gelo a correr-me no corpo. na pele. está frio.
sinto-me prisioneiro. as estações do ano sucedem-se sem que eu dê por elas, mas está frio.
a música está muito alta. o silêncio também. são cinco da tarde e eu estou deitado. ainda. as paredes são brancas, mas a solidão não. curioso como tantos anos depois são exatamente os mesmos violinos a preencher os mesmos espaços. está frio.
ao contrário do que dizem, escrever é inquietação e adensa a ausência. materializa-a e permite-me tocar-lhe. escrever também pode ser alegria, mas essencialmente é uma forma refinada de masoquismo. eu, pelo menos, sofro quase sempre que escrevo e, no entanto, não paro de o fazer. mesmo com este frio.