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(...) cá estou eu, por aqui, a fingir que sou eu que por aqui estou (...)

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Alguns dos textos aqui contidos são de cariz sexual e só devem ser lidos por maiores de 18 anos e por quem tiver uma mente aberta. Se sentir algum tipo de desconforto com isso ou se não tiver os 18 anos ou mais, por favor SAIA agora.

Sofia

Março 28, 2020

  • Alguns escritores e, consequentemente, alguns leitores recusam o erotismo. Acreditam que este lhes retira imaginação e vulgariza as obras. Eu acredito no exato oposto. O erotismo estimula a imaginação. Por vezes de tal forma que lê-lo ou escrevê-lo tem consequências físicas. Quanto ao vulgarizar uma obra, também não me parece natural que o foco de uma obra seja o erotismo, mas incluí-lo em um romance ou em outra história é escrever a própria vida. Se escrito com sinceridade e naturalidade é muito mais que um caminho fácil. Por outro lado, concentrar todo o trabalho na sexualidade é confundir a escrita com prostituição. Outra coisa que não me parece certa é separar o erotismo do pornográfico por algo tão subjetivo como o bom gosto. Eu acredito que é cada um de nós e as vivências de cada indivíduo a fazer essa separação e mais, para cada um, a linha que separa erótico e pornográfico, traça-se em locais diferentes, consoante é desenhada em público ou privado.

    Da mesma forma, parte das pessoas não acredita no amor e uma parte ainda maior não acredita que possa acontecer à primeira vista. Eu acho que depende da definição de amor. O das pequenas coisas não pode acontecer à primeira vista. Como se costuma dizer: ninguém ama até ver as primeiras cuecas sujas no chão da casa de banho. No entanto, há um outro, o que permite, por exemplo, sobreviver às primeiras cuecas sujas e até lhes achar piada, que pode acontecer à primeira vista. Esse, mais profundo, não tem grandes explicações e não vem com um manual onde todos os ingredientes venham discriminados em uma bem explicada receita. Esse é simples como o vento e complexo como as ondas. Esse é estranho: é gigante e, no entanto, cabe na fugacidade de uma palavra. Autêntica constelação efémera.

    Foi esse o sentimento do Filipe quando primeiro ouviu falar na Sofia. O que quer que tivesse acontecido, aconteceu antes de “à primeira vista”. Não sabia dizer porquê, mas naquele momento todos os muros lhe pareceram feitos de água e teve a certeza da existência da eternidade. Naquele momento, breve e solar, sentiu que um novo caminho para casa se abria. A vida e a formação, proeminentemente científica, tinham-no treinado a não dar grande importância aos fervorosos e, por vezes, enganadores gritos do sangue. No entanto, algo diferente tinha acontecido. Como se um feitiço ou um anjo lhe tivessem segredado o fulgor, esqueceu todas as dificuldades que facilmente se adivinhavam e, sem nunca ter visto a Sofia, sentiu-lhe a frescura do beijo a ser fogo em cada milímetro da sua pele e ouviu dentro de si uma voz sussurrar-lhe insistentemente:

    - Parabéns! Parabéns! Parabéns!

    Aquele nome trazia com ele a incerteza de um poema e a arrebatadora ferocidade do mar. A beleza dos rios e o tumultuoso silêncio das tempestades tropicais. Húmido sufoco elevatório e rosas selvagens. Talvez azuis.

    Naquele dia, assim que chegou a casa, apressou-se a ir para o computador procurar o perfil da Sofia no Facebook. Encontrou, viu cada uma das fotografias e algumas publicações. No final da pesquisa sentia-se ainda mais entusiasmado. Apesar de algumas fotografias lhe terem provocado algo que não sabia explicar, sentia-se verdadeiramente entusiasmado e ansioso. Foi-lhe difícil controlar-se e, tal como lhe tinham pedido, esperar que fosse a Sofia a contactá-lo. Ela revelou-se uma mulher muito bonita e que demonstrava algum recato, mas onde o Filipe via uma intensa líbido.

    Morena, magra, com o cabelo escuro, ligeiramente ondulado, pouco abaixo dos ombros e normalmente penteado com uns óculos escuros a servir de bandolete. Os olhos, também escuros, pareciam conter a nossa galáxia inteira. Não por serem grandes, mas por brilharem intensamente. Certamente haveria neles muitas histórias para contar. No rosto desenhavam-se um nariz à maneira grega e uns lábios finamente arquitetados sobre a lisura. O peito não era exageradamente abundante, mas enquadrava-se na perfeição com o resto do corpo e o Filipe não conseguiu evitar sorrir e pensar que tinha a medida certa para as suas mãos. As pernas eram as de uma pantera. Misteriosas. Furtivas.

    O tempo que se seguiu foi de violento desassossego. Ciclicamente e com elevada frequência, o Filipe visitava o Facebook na esperança de lá encontrar um qualquer sinal da Sofia. Felizmente a espera não foi grande e um simples “olá” desenhou-lhe um sorriso no coração.


     

    •  

    Mesmo sentindo o que já sentia, até ele estava longe de imaginar o impacto que aquele “olá” teria na sua vida. As primeiras vezes que teclou com a Sofia serviram para confirmar que ela era uma mulher muito especial que juntava à beleza um corpo desconcertante e uma inteligência perturbadora que o excitava e deixava totalmente louco. Cada vez mais, o Filipe sentia-se atraído pela inteligência e ela tinha-a em várias vertentes: lógica, emocional, social, ecológica, etc. Estava tão enfeitiçado. Tão encantado. Nem se apercebeu. Ela desligava-se do Facebook sempre à mesma hora. Passaram-se meses e o que nascera grande crescia.

    Demorou também meses até ele juntar a coragem necessária para propor à Sofia conhecê-la pessoalmente. Quando ela aceitou, a alegria foi tão grande que, na sua cabeça, pintou o nome e múltiplas imagens dela nas paredes do quarto e no ar à sua volta. Quando terminou ela dançava, vestida apenas com uma túnica em cetim branco, ou simplesmente flutuava em todos os espaços que o rodeavam.

    No dia planeado, horas antes do combinado, sentou-se na esplanada marcada, pediu um café e entregou-se à leitura. Estava ansioso. Não conseguia concentrar-se. Todos os ruídos eram um bom motivo para se desviar do livro e procurar a Sofia.

    A esplanada era um estrado em madeira rodeado por uma cerca, também em madeira, com a altura certa para uma pessoa sentada poder nela apoiar os braços e debruçar-se como se estivesse em uma janela. Já em antevisão, o Filipe escolheu uma mesa junto à cerca e do lado por onde provavelmente ela viria. Daquela posição, para além de poder controlar a chegada da Sofia, ele via um pequeno bosque de gordas e relativamente baixas oliveiras. No centro de Almada, um denso bosque como aquele, apesar de pequeno, era um enorme e repousante oásis. Dos ramos de algumas oliveiras, suspendiam-se cordas de flores brancas e noutros ou nos mesmos havia pequenos pássaros a encorajar os amantes com deliciosas melodias. Almada até é uma cidade agradável onde vários espaços verdes se combinam com o rio e com a farta luz para dar aos seus habitantes muito mais que um local para dormir, mas não ali. No centro, de ferro e cimento, aquele bosque era um raro centro de vida.

    Quando finalmente ela vinha a chegar, o Filipe inclinou-se sobre a cerca e, com o queixo apoiado nos braços, observou-a com óbvio deslumbramento. Com o mesmo encanto com que se olham as pérolas. A cada passo, sob os seus pés, acendia-se um relâmpago de pura energia, uma coroa luminosa que se apagava quando o pé deixava de tocar o chão.

    Era ainda mais perfeita que nas fotografias. A cada passada os quadris pareciam dançar dentro do vestido que trazia. Da esquerda para a direita e novamente para a esquerda. Movimentos ligeiros, mas que o seduziam. Os braços estavam caídos ao longo do corpo e também pareciam dançar com as ancas. O Filipe, olhos fixos, sorriso nervoso, estava como que hipnotizado. O vestido era de um azul céu muito intenso, caí-lhe sereno até aos pés, mas, como ele entrelinhas tinha pedido, deixava destapados os ombros, sendo apenas suportado por finas alças. Os seios provocavam duas firmes elevações no vestido e compunham um quadro real que os olhos dele transformavam em sonho:

    - Filipe?

    A voz, tão doce que cheguei a pensar que me ecoaria no sangue para sempre. O sorriso. O Sol, a brilhar com vigor atrás dela:

    - Sim, sou eu. Sofia, certo? Senta-te.

    Cumprimentou-o com dois beijos na cara – gesto simples e rotineiro, mas suficiente para levá-la com ele a uma outra dimensão onde tudo era fulgor e a nudez obrigatória. A sensação que tinham é que já se conheciam há anos, a conversa fluía com facilidade e a cumplicidade crescia a cada palavra. Estavam ali há duas horas, mas parecia-lhes terem passado apenas alguns minutos. As longas, antigas e quase diárias conversas na internet tinham elevado ao extremo a confiança mútua:

    - Quero mostrar-te uma coisa, mas sê discreto. – Disse ela, enquanto pousava uma das mãos sobre a mesa. Passados poucos segundos, a mão foi envolvida por uma cobertura gelatinosa e transparente. Passados alguns segundos um gradiente de invisibilidade iniciou-se no cotovelo e a mão desapareceu. Aquilo assustou-o. Em um movimento único e repentino, endireitou as costas, arrastou um pouco a cadeira para trás e gaguejou relativamente alto:

    - O que é isso, Sofia?

    - Isso é que é descrição?

    - Desculpa. – Recompôs-se e voltou à carga, agora a sussurrar: - O que é isso?

    - Uma liga qualquer de titânio, diamante e mais umas coisas. É flexível e transparente, mas é quase totalmente inquebrável. Só lâminas feitas com uma liga de ruténio e paládio a conseguem penetrar. Lâminas e balas. Se quiser posso fazer isto em todo o corpo. Também consigo controlar a visibilidade de qualquer parte do corpo.

    - Lady Titânio?

    - Sim, ganhei esse nome quando me caiu um bocadinho da armadura, analisaram e viram que tinha muito titânio.

    - Estou parvo. A Lady Titânio não é ruiva?

    - Sim. Também mudo as cores do cabelo e dos olhos. Até a pele clareio.

    - Como é que isto aconteceu? Aquela agilidade toda da Lady Titânio, só a tens mascarada?

    - Não sei. Desde que me lembro que tenho esta capacidade, mas a Lady Titânio só nasceu há três anos mais ou menos. A agilidade é mesmo minha. Eu confiei em ti, agora vê lá.

    - Podes ficar descansada. Só pensar na tua agilidade e no que podes fazer com ela é um mais que bom motivo para não te partilhar com ninguém.

    Sorriram ambos.

    - Tens mais algum segredo que me queiras contar? – Perguntou ele, sem esconder uma leve ironia.

    - Para além de, como dizes, ser bastante ágil – disse-lhe ela –, também não preciso de me transformar para ficar insensível ao toque e à dor.

    - Nesse caso, quando nos envolvermos, terei que te que te ir dizendo onde tenho as mãos.

    Voltaram a sorrir.

    - És tão parvo!


     

    •  

    O tempo ia passando como água a escorrer-lhes entre os dedos. O Sol já só tinha a robustez e cintilação da Lua por nascer. Combinaram novo encontro para assim que pudessem e, com a mesma graciosidade com que chegara, a Sofia levantou-se e partiu. O Filipe voltou a inclinar-se e a apoiar-se sobre a cerca. Os olhos brilhavam-lhe enquanto se encantava com a sensualidade dançante que lhe concediam os movimentos brandos do corpo dela.

    Para além de não lhe tapar os ombros, o vestido da Sofia tinha um generoso decote nas costas e ajustava-se na perfeição às suas linhas, realçando-as. O Filipe gostava de ver as pernas de uma mulher e os mistérios dentro daquele vestido comprido despoletavam nele uma, quase incontrolável, ânsia. A cada passo, as nádegas dela contraiam-se e provocavam ainda mais o desejo dele. As costas destapadas, as pernas escondidas, as nádegas contraídas, os quadris bamboleantes, a perfeita silhueta.  O Filipe sorria. Deleitava-se com os corredores que ela abria no seu corpo e com os rios de cristal que, a ela, lhe corriam entre os lábios – que lhe navegavam entre os lábios como navios leves. O seu fulgurante sorriso era como uma cidade acordada. Acesa. Uma cidade, a ele, a flutuar-lhe na imaginação. Uma cidade de desejo com telhados de furor e ruas abertas entre a tranquilidade e o vermelho. Uma cidade em que, em cada janela, havia uma mulher a cantar e a beber mel entre cada estrofe, onde, em cada janela, havia uma manta estendida a indicar que era aquela a morada do Sol.

    Todas as noites, antes de dormir, o Filipe sentia-se a solidão a percorrer uma rua até ser de manhã. Cambaleante. Um tronco à deriva na imensidão. No entanto, bastava-lhe imaginar a sombra sempre radiante da Sofia para que peixes, transparentes e brilhantes como vidro, nadassem pelas ruas do infinito, protegidos pela densidade do silêncio. Nadassem alegres. Como se dançassem.

    Voltaram à internet, às longas e diárias conversas. Poucos dias depois, em uma nota de rodapé de última hora, o Filipe leu que graças à Lady Titânio, o Tigre Tuga – famoso traficante de armas – tinha sido preso. Quando, nessa noite, falou nisso à Sofia, ela limitou-se a dizer que as notícias eram exageradas e não quis falar mais nisso. Ele respeitou, mas a verdade é que não eram exageradas. Havia imagens. Qualquer pessoa podia ver que, sozinha, a Lady Titânio tinha enfrentado e derrotado os cinco homens, fortemente armados, que estavam entre a polícia e o Tigre. A velocidade estonteante, a tremenda agilidade e os arpões metálicos que, do nada, lhe surgiam nas mãos, foram as únicas armas que usou.

    Um flick flack e atingia um dos homens, um salto e eliminava outro. Foi breve o tempo que demorou para anular a resistência e abrir caminho à polícia. O Filipe via em cada movimento uma ousada posição sexual que a Sofia lhe podia oferecer e sorria. Sorria muito. Mais do que sorrir por imaginá-la nua, sorria especialmente por estar a presumir que ela quereria oferecer-lhe alguma coisa.


     

    •  

    Nessa mesma noite, o Filipe ganhou coragem, fez-se convidado e propôs à Sofia visitá-la em casa dela. Ela aceitou e ele, embora disfarçadamente, quase explodiu de alegria. Por fora, agia como se nada fosse. Por dentro, repetia gritos e mortais à retaguarda. Sentimento já conhecido de quando ela aceitou conhecerem-se.

    No dia que tinham planeado, tal como acontecera a primeira vez que combinaram encontrar-se, o Filipe chegou muito antes da hora marcada. A Sofia morava em uma vivenda térrea com um bem arranjado e florido jardim. Com um limoeiro e um abacateiro a projetarem a sua sombra sobre várias flores e com este este último a esmerar-se nesse trabalho. Não queria parecer demasiado ansioso, por isso sentou-se no lancil do passeio à espera de uma hora mais apropriada para tocar. Enquanto esperava, uma mulher mais velha saiu de casa. Como que a fixar as feições dele ou a fingir que o fazia, a mulher, provavelmente mãe da Sofia, olhou demoradamente para ele. Talvez tentasse intimidá-lo. Passado algum tempo achou que já era admissível anunciar a sua presença e tocou.

    Novamente, um total encantamento apoderou-se dele ao vê-la. A Sofia tinha um florido vestido comprido, um caicai que roubava o fôlego ao Filipe:

    - Cristo! – Exclamou ele mentalmente, tentando disfarçar o encanto com um sorriso nervoso.

    A Sofia deslizou pelo jardim até ao portão. É um clichê comparar uma mulher com uma flor, mas era o que estava à vista e na cabeça do Filipe: um jardim cheio de flores; um vestido florido; uma beleza floral; um corpo que dança como um caule ao vento. Pele como uma pétala. Sorridente, abriu o portão, deu um pequeno pulo para perto dele e cumprimentou-o com dois beijos enquanto lhe colocava com suavidade a mão no peito. Falaram um pouco sobre trivialidades e a Sofia atreveu-se:

    - Tenho um lanche preparado para nós no jardim das traseiras, mas primeiro gostava que conhecesses a casa.

    - Claro.

    - Vem comigo!

    Seguiu-a para dentro de casa e sentia-se mais entusiasmado a cada divisão. A sala de jantar, a cozinha, o quarto da mãe, o quarto dela:

    - É aqui que tens o computador?

    - Sim, está ali ao canto. Entra!

    - Posso?

    - Claro. Já entras diariamente. – Disse-lhe ela, entrando à sua frente como que a indicar-lhe o caminho.

    Ele entrou atrás dela, olhos fixos na dança, sensualmente executada, eroticamente desenhada pelo corpo da Sofia. Colocou-lhe uma mão sobre o ombro, forçando-a a parar.

    Ficaram naquela posição alguns segundos. Até que, em um movimento veloz e único, ele rodou-a para si. Estavam muito juntos. O Filipe puxou-a ainda mais. Segurou-a pela nuca e beijou-lhe os lábios. Afastou ligeiramente os dele dos dela e murmurou-lhe com os olhos, de novo, presos, agora nos dela e a refletirem a serenidade e desejo sentidos:

    - Em cada um dos teus olhos é possível adivinhar o lume e conseguem-se ver o mar, os rios e a terra molhada.


     

    •  

    Aquelas palavras foram gatilho de avidez. A Sofia arrancou a camisa que ele vestia. Alguns botões saltaram com a pressa do movimento. O peito dele, assim despido e perto dela, cheirava-lhe a Sol. Voltaram a beijar-se. A boca dela, esfomeada e entreaberta, desenhava-lhe agora mistérios no peito. A sua língua. Os seus olhos cintilantes, os lábios, o mar e o perpétuo movimento. O corpo dele rendido. Trémulo. Húmido e longo. No corpo dela o fulgor. Dança ansiosa. O imaginado entra e sai. Ruborescer. Ele segurava e beijava e sufocava nas pérolas.

    Os seus dedos alongavam até mergulharem. Até se esconderem no ninho dos segredos. Tal como dissera que faria, com a voz arrastada, ele sussurrou-lhe:

    - Estou a penetrar-te com um dedo. Posso meter outro?

    Ela soltou um gemido e respondeu que sim:

    - Já está, querida. Não sentes? – Perguntou ele, enquanto fazia movimentos circulares e, em simultâneo, ritmava os dedos para entrarem e saírem dela sempre à mesma velocidade:

    - Aí não. Sinto no cérebro.

    - Estão a entrar e a sair-te do corpo. – Murmurou.

    Ela gemeu novamente. Ele via flores. A crescerem no corpo dela ao seu toque. O gemido e o sorriso. Os suores misturados, as chamas (o contorcer das chamas) e o segurar do grito entre as pálpebras. O imperecível recomeço e lágrimas. Pensava o mar: cada onda lhe parecia a primavera, curvada na pele dela. O branco: a rebelião no gemido, a avidez dos dedos a penetrarem a juventude. O azul: sereno, infindável, forte. A voz dela.

    O persistente e fresco perfume, deixado pelo sal e pelos olhos fechados, o hálito ardente do nosso desejo. A fagulha. O princípio do fogo, o início do infinito. O lume no sangue que era febre no rosto. Momentos cálidos em que os gestos de cada um eram os gestos do outro e, outra vez, o mar. Agora, nas mãos dela. O amor era urgente e ela era urgente. Era urgente a certeza da incerteza e, outra vez, o mar. Dos dedos aos lábios. As mãos dela eram como espadas sedentas, mas lentas.

    Ele atirou-a para a cama e deitou-se sobre ela. O corpo dele serpenteava voraz sobre o luxurioso colchão que o dela lhe dava. Levantou-lhe o vestido e passou os dedos levemente pelo interior das coxas. Nem a maciez rígida das pernas, nem o fresco e azul calor que delas provinha, o prepararam para o misterioso trovão nas suas costas, provocado pelo nervo da virilha dela a contrair-se na sua mão. Depois, desviou a ternura e deixou que os dedos a bebessem sedenta e profundamente.

    Ao ouvido, disse-lhe baixinho o que estava a fazer e a sentir. Ela arqueou o corpo, ele cerrou os olhos e prendeu um gemido. Claramente, dizer o que ia fazendo aumentava o prazer de ambos. Sem fazer muita força, o Filipe agarrou-lhe no pescoço e disse-lhe:

    - És uma gatinha malcomportada, tens de ser castigada. Sabes que se eu te cortar a jugular morres em três ou quatro segundos? Se eu – tirou os dedos de dentro dela, a mão deslizou na pele e alojou-se no coração -, no entanto, te esfaquear aqui a morte é imediata e indolor. Eu preferia golpear-te na barriga. Talvez nem morresses e eu pudesse deliciar-me com a tua expressão de dor e com o contorcer do teu corpo comigo dentro dele.

    Agarrou-lhe no cabelo e beijou-a terna e demoradamente. Estava húmido e rígido, mas não entrou nela com o seu pénis. Antes disso um violento vulcão explodiu dentro deles e, em seguida, uma deliciosa e serena exaustão tomou-lhes conta do corpo arrepiado:

    - Filipe?

    - Sim?

    A Sofia respondeu com um sorriso.


     

    •  

    - Não havia aí um lanche qualquer? – Perguntou o Filipe, com nítida ironia.

    - Sim. Tens fome?

    O Filipe sorriu e respondeu:

    - Isso é uma pergunta com rasteira. Se eu responder “sim” tu pensas: “depois deste momento já a pensar em comida?” se, por outro lado, disser “não” tu pensas: “nem fome te dei?”, por isso respondo: e tu, tens?

    - Parvo, diz lá, tens? De qualquer forma, entretanto, temos de ir para o quintal que a minha mãe deve estar aí a vir.

    - Já se comia. – Respondeu, já a levantar-se e a procurar a camisa. – Não tens aí uma t-shirt? Arrancaste alguns botões a isto.

    A Sofia riu-se:

    - Não que te sirvam, mas tenho aí camisolas que devem servir. Vestes por cima. Escolhe uma da gaveta de cima da cómoda. Não quero estragar o momento, mas não podemos repetir isto.

    Em choque, o Filipe gelou e perguntou porquê:

    - É perigoso. Se descobrem é um risco para ti.

    - Primeiro, quem decide se quero correr riscos sou eu. Segundo, não somos uns adolescentes, não precisamos de andar aí a dizer e a mostrar ao mundo que estamos juntos e que gostamos um do outro.

    A Sofia sorriu:

    - Gostamos?

    - O que achas?

    - Não sei. Diz-me tu. Gostas? Eu, se não gostasse, não me envolvia. Tu, não sei.

    - Eu adoro-te, Sofia. Adoro-te, amo-te, estou apaixonado por ti. Como queiras. O, para mim, mais importante foi sentir o mundo parar e quase ficar sem ar quando me convidaste para vir a tua casa. O mais importante foi o meu sangue a fervilhar quando primeiro ouvi falar de ti. Foi quase explodir quando te parei pelo ombro. Foi o sorriso no coração que me provocou a tua voz. Bem, há muito mais, mas vou ficar por aqui.

    A alegria da Sofia era cada vez mais evidente e o sorriso já lhe contagiara os olhos e o resto da perfeição do rosto:

    - Não achas perigoso?

    - Hoje é quinta, amanhã é sexta. Queres ir ao cinema?

    Ela riu-se, encantada com a súbita mudança de assunto:

    - Sim, se hoje é quinta, amanhã é sexta, mas sim, já que insistes, quero.

    - Engraçadinha! Fico feliz. Venho buscar-te às vinte, mas eu não insisti. – Sorriu com metade da boca e continuou: - Vamos lá lanchar!

    Ela, finalmente, levantou-se da cama, ainda com vestígios do que tinha acontecido e, aos olhos dele, flutuou pelo quarto com relâmpagos quentes e brilhantes a saírem das costas e a acompanhá-la até ela lhe agarrar a mão e o conduzir até fora do quarto. Para trás, ficava a marca da paixão e uma cama a cheirar a lume. Um furacão parecia ter ali passado:

    - Espera um pouco. Vou só dar um jeito a isto.


     

    •  

    Ao chegar ao jardim, ele não fez qualquer comentário, mas ficou feliz ao perceber que ela havia tido extremo cuidado na escolha dos elementos do lanche e a colocá-los sobre a mesa. De doces a salgados e várias bebidas. Havia de tudo e tudo estava no local certo. A mesa, assim posta, demonstrava gosto em receber e cuidado ao fazê-lo. O Filipe sabia estar a ser algo pretensioso ou, até mesmo, algo convencido, mas não conseguia evitar pensar que ele era um dos motivos de tanto cuidado.

    A mesa estava sob a sombra que uma imponente nespereira fornecia em conjunto com um grande chapéu-de-sol. O aroma a flores e fruta fresca era intenso e misturava-se ao cheiro da terra para apurar ainda mais o, já por si, repousante ambiente.

    Sentaram-se lado a lado. A primeira vez que comeu algo, o Filipe brincou e fingiu limpar uma mão na perna da Sofia. Repetiu a brincadeira várias vezes e de cada vez que o fazia ria-se menos, acariciava mais a perna e aproximava-se mais do centro do mundo. A Sofia sorria. Quando chegou ao topo da montanha agarrou-se com firmeza e ouviu a Sofia:

    - Acaba lá com isso que a minha mãe deve estar mesmo a chegar!

    Foi incapaz de disfarçar a tristeza, mas a Sofia tinha razão e nem cinco minutos tinham passado quando a senhora chegou. A Sofia levantou-se e apresentou a mãe ao Filipe. Era a mesma senhora que ele vira a sair de casa o que lhe deu a sensação de já a conhecer:

    - Muito prazer, D. Gracinda!

    - Senta-te aqui connosco, mãe!

    - Sabe, Filipe, a Sofia tem uma camisola igualzinha à sua.

    - Bom gosto. – Respondeu ele, a sorrir e a tentar esconder um crescente nervosismo. Olhou para a Sofia, como quem grita um pedido de ajuda:

    - É unissexo, mãe!

    - Eu sei, só achei curiosa a coincidência. É coincidência, certo, Filipe?

    - Claro que sim. Eu gosto muito da Sofia, mas ainda não lhe conheço a roupa. Nem tenho poderes de adivinhação. Embora, em relação a ela, já me tenham surgido algumas coisas, mas estão todas por confirmar.

    Sorriram os três e a Sofia ruboresceu, embora lhe tenha agradado ouvi-lo dizer à mãe que gostava dela.


     

    •  

    A noite foi de antecipação e grande ansiedade. Às voltas na cama, o Filipe alternava entre a memória e a imaginação. Todos os cenários, para o dia seguinte, que lhe passavam pela cabeça, terminavam em um febril e audaz pensamento envolvendo a Sofia. O quarto parecia-lhe pequeno e o calor dava-lhe voltas ao corpo. Estar quase despido não o ajudava. Os lençóis sobre a pele recordavam-lhe a suavidade com que ela lhe tocava e também não o ajudavam. Estava excitado. Rígido. A Sofia incendiava-o. Não sabia extinguir aquele lume, mas sabia que só depois de o apagar poderia dormir.

    Da mesma forma, na cama dela, a Sofia tinha substituído o sono pela voz arrastada dele a sussurrar-lhe onde tinha os dedos e o que estava a fazer com eles. A imagem dele no jardim a tocar-lhe, primeiro na perna e depois a apertá-la, fizeram-na soltar um pequeno gemido, logo reprimido. A inquietação é que era impossível reprimir e alimentava-lhe a insónia.


     

    •  

    Às vinte em ponto, a campainha da Sofia tocou. Ela apressou-se para a saída com pequenos saltos a substituírem os passos:

    - Credo, Sofia. É só uma ida ao cinema.

    - Oh! Cala-te, mãe!

    Quando abriu o portão, ouviu, quase de imediato, o Filipe dizer que ela estava linda. A voz dele lembrou-lhe como ele a usara no dia anterior. Um arrepio percorreu-a e paralisou-a:

    - Sofia? Estás bem?

    Ela estava de minissaia e com umas collants escuras de rede larga. As collants combinavam na perfeição com o resto da roupa, com a cor do cabelo e com a discreta e suave maquilhagem que ela usava:

    - Sim, desculpa. Vamos!

    Saiu de casa e, à frente dele, permitindo que ele novamente se encantasse, encaminhou-se para o único carro estacionado ali perto. Com magnética graciosidade, apontou-o e perguntou:

    - É o teu carro?

    - É.

    Abriu-lhe a porta e ela entrou de uma forma tão casual e, em simultâneo, sensual que o deixou excitado.

    A curta viagem foi perfeita. A Sofia, não sei se de propósito ou sem intenção, sentou-se e afastou ligeiramente os joelhos. Ela reclamou do frio, mas foi ela que lhe pegou fogo ao corpo e obrigou a abrir a janela. Quando chegaram, apesar da janela aberta, o rosto dele estava muito vermelho e tinha escrito “desejo” nos olhos, na boca, em cada um dos vincos da testa e por todo o lado.

    Estacionou, esperou que ela saísse e deu um profundíssimo suspiro.  De seguida saiu também, olhou para ela e, de novo, teve de disfarçar uma ereção. Deu-lhe a mão e encaminharam-se para o cinema. Ela sorria.

    Chamas rodeavam os dois. Bastava tocarem-se para o incêndio crescer. Seguiam pelo passeio e deixavam para trás um rasto de pedra derretida. Marcavam o chão com o calor que emanavam.

    Ele já tinha comprado os bilhetes, entraram assim que chegaram e ainda bem, pois já estavam atrasados. Era uma sala à moda antiga. Com balcão, plateia e camarotes. Todos vazios. Na realidade, havia pouquíssimas pessoas no cinema. Dois casais na plateia e mais cinco pessoas no balcão, sete com eles. Parece que a ação finlandesa não atrai muita gente.

    Uma moça, nova e muito acelerada, levou-os ao interior da sala – quase os obrigando a correr atrás dela – e disse-lhes para se sentarem onde quisessem. Escolheram uma fila vazia no topo do balcão, encostada à parede que marcava o fim da sala e a separava da cabina de projeção. Sentaram-se nas cadeiras do centro da fila, alinhados com o meio do ecrã.

    Assim que as luzes se apagaram, o Filipe abraçou-a e sentiu o sangue fervilhar. Tocar na Sofia, mesmo que fosse um toque fortuito, despertava nele um desejo colossal. Ela vestia uma blusa preta com um fino casaco de malha e ele não resistiu a pôr a mão dentro do casaco e, enquanto a abraçava, agarrou-lhe um seio com moderada força e brincou-lhe com um mamilo, agarrando-o, torcendo-o e beliscando-o ao de leve. Pousou-lhe a cabeça sobre o ombro e disse-lhe estar a tocar-lhe um seio. Ela sorriu e disse que sabia. A voz dele e a ideia do que estava a fazer, fê-la afastar os joelhos e relaxar as coxas. Ao aperceber-se do gesto, ele lançou-lhe a mão sobre o sexo e, com avidez, levou a mão ao interior de toda a roupa. Os dedos faziam movimentos circulares sobre os lábios. A mão apertou-lhe a vagina. Segredou-lhe:

    - Vou penetrar-te, Sofia.

    Ela olhou para ele e sorriu em consentimento. O dedo dele entrou profundamente nela. Ele disse-lhe e viu-a fechar os olhos e arquear os lábios. O desejo dele cresceu e já nem a ganga conseguia escondê-lo. O Filipe endireitou-se na cadeira, segurou na mão dela e pousou-a sobre o pénis. Ela acariciou-o.

    Seriam os libidinosos gestos visíveis ao resto da sala? Não estavam preocupados. Pelo contrário, a ideia de serem vistos não os agradava, mas parecia aumentar-lhes a excitação. O risco aumentava-lhes o desejo de se tocarem, aumentando a voracidade com que o faziam.

    Ela desapertou-lhe alguns botões e, ainda deitada no ombro dele, introduziu-lhe a mão dentro das calças. Acariciava-o e procurava a abertura que lhe permitiria tocar a pele do amante. Até que lhe agarrou no pénis. Ele sentiu um arrepio, cerrou os dentes e os olhos, evitou qualquer som, tremeu e fez força para segurar um gemido. Ela fez alguns movimentos e tirou-lhe o pénis para fora. Rígido. Ereto. Húmido. Latejante.

    Abraçou-o com os dedos, mas parecia não ter a certeza do que fazer a seguir. Ele agarrou-lhe na mão e orientou-lhe os movimentos. O Filipe, de vez em quando, não conseguia controlar-se totalmente e soltava um ofegante suspiro. Alturas em que ela abrandava o ritmo ou parava e apertava-o com força, como se quisesse prolongar-lhe o prazer.

    Ao fim de alguns minutos, ele sentia-se quase a perder os sentidos. Um violento tremor percorreu-lhe o corpo e o êxtase branco envolveu os dedos dela:

    - Desculpa, sujei-te a mão. – Disse-lhe ele quando conseguiu falar.

    - Não tem mal. Isto não é sujo.


     

    •  

    Implicou alguma ginástica e muito amor, mas viram o resto do filme abraçados. Quando acabou, nenhuma das poucas pessoas que estavam no cinema seguiu o mesmo caminho que eles.  Iam de mãos dadas para o carro quando foram abordados por quatro jovens que os ameaçaram com facas, exigindo carteiras e telemóveis:

    - Vocês não querem fazer isso. – Disse a Sofia.

    - Olha, olha. Temos aqui heroína.

    O rapaz que lhe respondeu, apontou-lhe a faca aos olhos. Quase tocava o rosto dela com a lâmina. De imediato, o cabelo da Sofia ficou ruivo e a íris vermelha. Dos pés para cima, começou a envolvê-la a mesma cobertura transparente e gelatinosa que dias antes o Filipe tinha visto crescer-lhe na mão. À medida que a cobertura a ia envolvendo, a roupa dela ia-se transformando em um macacão justo de latex azul. O rapaz que lhe tinha apontado a faca gaguejou:

    - La-dy Ti-ti-tâ-tâ-nio!

    Os quatro assaltantes puseram-se em fuga, um remoinho de vento envolveu-a e em menos de três segundos a Lady Titânio voltava a ser a Sofia:

    - Esta é uma das vantagens da fama.


     

    •  

    No dia seguinte, em um sinistro e sombrio armazém em Lisboa, onde raros fios de Sol entravam pelas pequenas janelas no topo das paredes, misturavam-se com o pó do ambiente e desenhavam no ar uma complexa e geométrica teia, os quatro jovens que tinham tentado assaltar a Sofia e o Filipe relatavam ao Lobo – poderoso chefe da criminalidade – o que acontecera:

    - Têm a certeza?

    - Sim, ela transformou-se na nossa frente e iam de mãos dadas.

    - Muito bem. Tragam-no cá!

    O Filipe tinha passado a noite a pensar na Sofia, no que acontecera no cinema e em como poderia exponenciar o prazer dela.

    Como era hábito aos sábados, depois de almoçar, saiu para beber café, mas nesse dia, assim que saiu do prédio, foi violentamente abordado por um grupo de encapuçados que o vendaram e atiraram para as traseiras de uma carrinha. Na janela do primeiro andar a mãe gritava impotente. Um dos encapuçados dirigiu-se a ela:

    - Acaba lá com os gritos, velha. Vou deixar aqui um papel com uma morada, diz à namoradinha do teu filho para ir buscá-lo e se quiserem voltar a vê-lo não metam polícia nisto!

    A mãe do Filipe ficou em choque, desesperada e sem saber o que fazer. Ele nunca lhe tinha falado em namorada. Subitamente, lembrou-se que ele tinha uma fotografia da Sofia no quarto e que passava horas ao computador com ela. Talvez fosse ela a “namoradinha” a quem o homem se referia. Correu a ligar o computador e, enquanto esperava, sentiu espadas na garganta e teve medo. Sentiu que algo lhe esmagava os ossos e teve medo. Felizmente, o Filipe tinha um portátil que só ele usava e não tinha senhas em nada.  Foi fácil aceder ao Facebook do filho. Quando o abriu viu que ele já tinha notificações de novas mensagens. Pelo menos uma era de uma Sofia. Abriu-a. Fez questão de não ler a mensagem, mas olhou para a fotografia de perfil, olhou para a fotografia que estava em cima da estante e confirmou que era a mesma pessoa. Enviou uma mensagem a explicar o que estava a acontecer e ficou pregada ao monitor. Apenas alguns segundos depois veio a resposta:

    “Olá, boa tarde. Eu e o Filipe não somos namorados, mas deve ser a mim que eles se referem. Envie-me a morada que eu vou lá.”

    Ela escreveu a morada e acrescentou:

    “Obrigado, filha. Não é perigoso?”

    “Talvez, mas não há alternativa. Não se preocupe, vou ter extremo cuidado. Comigo e com ele.”

    Só a preocupação a impediu de se perguntar porque estaria a Sofia a dizer que teria cuidado como se já soubesse que algo grave estava a acontecer.


     

    •  

    Demorou apenas o tempo de decidir se iria no carro dela ou não, como não sabia o que iria encontrar, a Sofia decidiu que o melhor era ir no seu carro e saiu.

    Nas redondezas da casa dela havia apenas uma outra, que tinha, em frente, uma reentrância no passeio que ela achava perfeita para deixar o carro. Na casa, morava um homem, com cerca de sessenta anos, que estava sozinho desde que a mulher morrera, há três anos.  Quando meteu a chave ao carro, ela olhou fortuitamente para a janela e viu, através de uma fresta das mal fechadas cortinas, o vizinho totalmente nu e uma mulher, com cerca de vinte anos, ajoelhada em frente a ele. A sala estava mal iluminada e ela distinguia-lhes apenas os vultos.

    A mulher estava em tronco nu, os seios eram grandes e firmes, tinha o pénis dele na boca e chupava-o com fervor. O homem tinha uma mão na cabeça da mulher e acompanhava-lhe os movimentos. A Sofia desviou o olhar para o chão, sorriu e voltou a olhar para eles. Ela já não estava ajoelhada, encontrava-se de gatas, com as nádegas viradas para ele. O homem penetrou-a bruscamente. Agarrou-lhe nas ancas e repetiu um selvagem entra e sai. Os seios da mulher estavam pendentes e dançavam livremente ao mesmo ritmo com que as ancas do homem embatiam nas dela. Ele dobrou-se sobre ela e apertou-lhe os seios, apesar do ambiente sombrio, notou-se que, com alguma força. A Sofia sentiu-se excitada e não resistiu a observá-los durante mais alguns segundos. Ainda perturbada, entrou no carro, sentou-se e abriu as pernas. Sentiu-se tentada a tocar-se, mas não o fez. Voltou a sorrir e arrancou.

    A morada era em Lisboa e a Sofia teve de recorrer ao GPS. Pelo caminho, o silêncio e o isolamento proporcionados pela condução, transportaram os pensamentos dela para casa do vizinho e a imaginar que era o Filipe que estava a possuí-la daquela forma. Novamente se sentiu excitada, mas desta vez sentiu um ligeiro tremor e uma pequena gota de lascívia libertar-se e rolar-lhe pelas pernas.

    Quando chegou ao local indicado pelo GPS, ela viu que se tratava de um armazém com aspeto de abandonado. O local parecia ser uma antiga zona industrial. As ruas eram compridas, largas, cinzentas e frias. Até onde os olhos alcançavam, não havia um único sinal de vida. Passou de carro e imediatamente decidiu que entraria como Lady Titânio. Estacionou e saiu já transformada.


     

    •  

    O látex azul, brilhante e ajustado a cada linha do corpo, o cabelo vermelho e a alvura da pele não só transformavam a Sofia em Lady Titânio como faziam da heroína uma daquelas mulheres com sensualidade capaz de tirar um planeta da sua órbita. A firmeza dos passos e o olhar concentrado davam-lhe um ar corajoso, decidido e, ao mesmo tempo, sedutor.

    Sem nunca parar, num ato continuo, abriu o armazém com um seco pontapé na porta e, assim que entrou, homens armados surgiram de todos os lados e formaram um círculo à volta dela. Estavam prontos a disparar e todos apontavam para ela. De imediato, a Lady Titânio desapareceu. Os homens, assustados e incrédulos, viram-se a apontar as armas uns aos outros e baixaram-nas. Ouviu-se um grito, mais de surpresa que de dor. Um dos homens caiu sobre os joelhos. Logo a seguir caiu outro e um terceiro se seguiu. Alguns fugiram, mas os que ficaram, todos eles caíram e as suas armas como que se arrastavam sozinhas até ao centro do círculo.

    Quando o círculo foi derrotado ela voltou a aparecer. Olhou em volta e viu o Filipe, claramente debilitado. Mãos amarradas atrás das costas. Sentado no chão, com o Lobo junto a ele e a encostar-lhe o cano de uma espingarda na cara. A Lady Titânio voltou a desaparecer e, logo de seguida, o Lobo sentiu a arma ser-lhe arrancada da mão e, por duas vezes, foi golpeado na cara com o cabo da própria espingarda, caindo ao chão. Ela reapareceu junto a eles e, com extrema doçura de movimentos, desamarrou o Filipe e ofereceu-lhe uma mão:

    - Vamos?

    Com a cara marcada pelo cativeiro e por evidentes maus-tratos, ele olhou para ela, sorriu e esticou-lhe a mão. Assim que as mãos se tocaram, o Filipe sentiu-se revigorar, abriu o sorriso e deu um pequeno salto para se pôr de pé. Ficou muito junto dela.

    Sentia nos lábios o calor na respiração dela. Sentia nos lábios a humidade na respiração dela. Tudo ao redor deles era lento. Agarrou-lhe na outra mão. As bocas quase se tocavam. As paredes do armazém rodavam à volta deles. Teve vontade de a beijar.

    Ela conduziu-o para fora do armazém e ele gostou. Levou-o para o carro e ele gostou. Ela contou-lhe como tinha ido ali parar, mas ele só ouvia as repousantes e frescas harmonias na voz dela. Tinhas os olhos fixos nela:

    - Porque me olhas assim, Filipe?


     

    •  

    - Meu querido filho! Deixa-me abraçar-te. Obrigada, querida! Muito obrigada! Tive tanto medo. Quero saber tudo. Ouviram? Sofia, come connosco!

    - Obrigada, D. Maria. Não posso, a minha mãe está à minha espera. O Filipe conta-lhe tudo. – Virou-se para ele, sorriu como se dissesse “Desenrasca-te!” e continuou: – Passa lá em casa amanhã.

    Nervoso, o Filipe sentou-se à mesa com a mãe e inventou que a Sofia era dos serviços secretos e que sabe umas coisas importantes:

    - E porque é que te raptaram a ti e não a ela?

    - Porque acharam que nós namoramos e que a fariam falar assim.

    - Fizeram?

    - Não.

    - Foi sozinha?

    - Não. Iam mais quatro ou cinco agentes. – A cadeira parecia feita de algo vivo e áspero, o Filipe estava irrequieto e mostrava-se tremendamente incomodado.

    A mãe conhecia-o bem:

    - Não sabes? Essa história está muito mal contada, mas está bem. O importante é que estás bem e aqui comigo.

    Depois de comer, era costume ele ajudar a mãe a arrumar a cozinha, mas naquele dia não o fez e rapidamente se fechou no quarto, como se tivesse voltado à adolescência. A mãe ficou na cozinha a sorrir e a abanar a cabeça negativamente. Não de reprovação, mas por achar piada ao filho ainda pensar que a pode enganar.


     

    •  

    “Sofia, estás por aí?”

    “Sim, estou. O jantar correu bem? O que é que disseste?”

    “Sim, correu.

    Inventei que eras dos serviços secretos e que sabias umas coisas. Que me raptaram na esperança de que falasses, mas que foste lá com mais cinco agentes e me libertaste.”

    “Ela acreditou?”

    “Sim.

    Olha, obrigado!”

    “Era o mínimo. Sempre vens cá amanhã?”

    “Sim, claro. Eu lá ia recusar um convite de Sua Alteza.

    Quem é que me raptou?”

    “Quem deu a ordem foi um criminoso chamado Lobo. Ele era perigoso, mas já não temos de nos preocupar com ele que eu fiz umas chamadas antes de entrar.  O problema agora é que se ele sabe, outros vão saber. É cada vez mais perigoso para ti. Se calhar é melhor nem cá vires amanhã.”

    “Não digas isso nem a brincar! Quem tem de saber se vales o risco sou eu. Não sejas prepotente ao ponto de achares a tua decisão mais inteligente só por ser tua.”

    “Calma! Só me estava a perguntar se não seria melhor esperar que as coisas acalmem.”

    “Eu quero ir aí amanhã.”

     

     

    “E eu quero que venhas, mas…”

    “Mas, nada.”

     

     

     “Está bem. Por volta das quinze.”

    “Combinado.”

    •  

    No dia seguinte, com uma pontualidade solar, o Filipe tocou à campainha de casa da Sofia. Para grande alegria dele, de novo ela tinha um vestido que não lhe escondia os ombros, desta vez liso, lilás e um pouco acima dos joelhos.

    Com a pressa dos furacões, a Sofia agarrou-o pela mão e puxou-o para dentro de casa. Pendurou-se no pescoço dele e beijou-lhe a boca. As línguas deles lutavam entre elas uma batalha onde não haveria vencidos. As mãos dele eram a ternura no vestido dela. Ele apertou-lhe as nádegas e não viu nela qualquer reação. Encostou-lhe as mãos nos ombros e afastou-a. Ela inquietou-se e perguntou-lhe se tinha feito alguma coisa mal:

    - Claro que não, mas também quero, pelo menos por momentos, saber o que é não te sentir.

    Olhou em volta, afastou-se e sentou-se em um cadeirão. Olhou-a fixamente como se a contemplasse e pediu-lhe:

    - Despe-te!

    Com um sorriso falsamente tímido, excitada com a ideia, a Sofia respondeu que não era capaz:

    - És sim. Começa pelas sandálias.

    A Sofia sentou-se na cama e, lenta como o abrir de uma flor, deslizou as mãos pelas coxas, segurou os joelhos, desceu pela barriga das pernas, como se elas fossem o mar e as suas mãos um barco à vela, desapertou as sandálias e descalçou-se. Excitou-o observar que ela não estava a representar e que a languidez dos movimentos era natural:

    - Agora tira o vestido!

    Ela sorriu. Maliciosamente. Já não a apoquentava a exposição. Levantou-se e apanhou a bainha do vestido. Com a dignidade da mais alta nobreza, tirou o vestido pela cabeça e atirou-o para cima do único candeeiro aceso. Encorpou a sombra. Erotizou o ambiente e revelou os segredos e mistérios que o embriagavam. Tinha a clareza e fulgor das manhãs na pele. As pernas e o ventre eram firmes. Ele podia adivinhar o fogo que o esperava nas pérolas e o desejo crescia-lhe. Imaginava-se a beber cada um dos sucos no corpo dela e o desejo crescia-lhe.

    Ela destapou os seios. Agarrou um deles e elevou-o até aos lábios. O gesto, acendeu um murmúrio ao Filipe. A nudez dela demorava-lhe nos olhos como tela renascentista:

    - Deita-te, Sofia! Despe-te totalmente!

    Ela deitou-se e, com graciosidade, despiu a roupa que lhe faltava. Abriu as pernas e tocou nos lábios. Afastou-os. Introduziu um dedo dentro dela, outro se seguiu e, por fim, um terceiro. Depois de lhe massajarem os lábios, os dois primeiros, abriram caminho para o terceiro dedo entrar e sair repetidamente.

    O Filipe via o brilho das cerejas – gotas de saliva a desprenderem-se. Não mais aguentou não lhe tocar, levantou-se e ajoelhou-se entre as pernas dela. Abriu-lhas ainda mais, afastou-lhe os pelos púbicos e mergulhou boca sobre a vagina. A língua dele entregou-se. Os dentes roçavam e mordiam o clitóris já inchado da Sofia. Ela arqueou o corpo e gritou. Com açúcar e ironia, ele disse-lhe:

    - Pensava que não sentias…

    - Não…, mas vejo.

    Riram, o Filipe levantou-se e deitou-se ao lado da Sofia. Ambos estavam de barriga para cima, com as pernas a penderem da cama e de olhos fixos no teto, como se estivessem a rever nele tudo que os unira:

    - Espera.

    A Sofia, agarrou-lhe no pénis e acariciou-o até ele voltar a endurecer e a latejar. Beijou-o. Puxou o Filipe até ele ficar com o pénis sobre o ventre dela. Ele serpenteava e ela, com os braços presos entre os dois, lutava para continuar as carícias. Um espasmo percorreu-o e ambos sentiram a repentina humidade. Pelo quarto, ecoaram gemidos e cores.


     

    •  

    - Promete-me uma coisa, Filipe. – A Sofia ia dar-lhe um beijo de despedida, mas lembrou-se de alguma coisa, inclinou-se para trás e afastou os lábios dos dele.

    - Que se passa?

    - Promete-me que vais redobrar a atenção. Tu viste o que aconteceu…

    - Claro que sim, mas não te preocupes, a Lady Titânio protege-me.

    Ela entregou-se à contemplação. Observava-o atentamente enquanto ele se afastava. Deleitava-se a ver os ombros largos dele. Deliciava-se com a forma inexorável dele contrair as nádegas quando andava.

    Quando ele pôs a chave na fechadura do carro deu-se uma tremenda explosão. O carro incendiou-se por completo e o Filipe foi projetado para trás. Um voo rápido que terminou com estrondo do lado oposto da rua.

    A Sofia tremeu e a sua expressão escureceu. Ainda antes do corpo do Filipe cair, ela correu na sua direção. Durante a corrida transformou-se. Quando chegou ao pé dele, com uma mão e com muita delicadeza, levantou-lhe a cabeça do chão. Ele já não respirava. Ela abraçou-o e, já em lágrimas, gaguejou:

    - Não te atrevas!

    Ele abriu os olhos e respondeu:

    - Não penses que é uma bombita que me tira da tua vida. Outra coisa: estás a magoar-me

Sofia

Agosto 19, 2018

Pelas janelas entra uma claridade só comparável com a luz das palavras que lhe navegam na língua como relâmpagos lentos. O calor é igual ao que lhe corre nas veias. Na pele escorrem-lhe gotas do meu desejo. Visões da sua nudez são a manhã e renovam como ela. Acordar ao lado da Sofia supera até adormecer com ela. Especialmente se acordar antes dela. Fico a ver-lhe o corpo despido e é como ver o Sol beijar o Verão. O furor.

Repito o ritual de outras manhãs: passeio as costas dos dedos pelo seu peito adormecido – pela perfeição que esconde atrás do alvo cetim que veste e que apenas lhe tapa parte do corpo. Consigo imaginar-lhe a pele despida, ligeiramente arrepiada a implorar o toque. Escondo os dedos no cabelo dela e acordo-a com um beijo suave nos lábios.

Assim que acorda, a Sofia transforma a minha boca no palco de uma luta viva entre o desejo e o amor. Olhamo-nos. Ofegantes. Os olhos dela estão meio fechados e meio revirados. Como que antecipam o que se avizinha.

Eu estava deitado sobre ela. Com os cotovelos ao lado dela e apoiados na cama para não lhe pesar demasiado. Uns segundos a beijar-me os lábios chegaram para aumentar até ao limite do suportável a temperatura do meu corpo. Guiado pelo seu insinuante e suave sorriso, levei a minha mão para o interior da sua blusa. Experimentei-lhe primeiro a lisura, maciez e calor do ventre e, conforme a mão subia em direção ao peito, a Sofia ia-me orientando com murmúrios, sussurrados gemidos – que prendia entre a língua e o céu – e arqueando com força o corpo. A minha respiração era descompassada. Travei o ar dentro do peito na tentativa de a controlar, mas não resultou. Quando lhe toquei no peito, senti-lhe as unhas cravarem-se e viajarem nas minhas costas. Soltei o ar num suspiro e, de novo, a respiração se descontrolou. O que eu sentia quando lhe tocava no peito rígido e, ao mesmo tempo, macio – quente e, ao mesmo tempo, fresco – era muito superior ao que conseguia controlar dentro de mim.

 

(continua, eventualmente)

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